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Abr/24

STF proíbe abordagem policial motivada por raça e cobra critérios objetivos

Ministros se posicionam contra o chamado perfilamento racial; elementos como posse de arma proibida devem ser requisitos para buscas sem mandado

O STF (Supremo Tribunal Federal) estabeleceu, nesta quinta-feira (11), que abordagens policiais devem estar fundamentadas em elementos objetivos, não sendo lícita a realização da medida com base na raça, o chamado perfilamento racial, nem por sexo, orientação sexual, cor da pele ou aparência física.

A corte definiu que a busca pessoal sem mandado judicial deve estar embasada em critérios objetivos, como se a pessoa estiver na posse de arma proibida, objetos ou papéis que constituam corpo de delito.

O julgamento ocorreu na análise de um caso específico em que a corte discutiu se provas colhidas pela polícia durante uma abordagem policial motivda pela cor da pessoa podem ser consideradas inválidas.

Os ministros convergiram em relação às premissas de que o perfilamento racial deve ser abolido da prática policial. No caso concreto em exame, no entanto, os ministros por maioria decidiram que não foi o caso de perfilamento racial. Ficou vencido, neste sentido, o relator do caso, o ministro Edson Fachin.

No habeas corpus em análise, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo sustentava que o auto de prisão em flagrante que resultou na condenação de um homem por tráfico de drogas é nulo, porque a busca policial foi baseada em filtragem racial, ou seja, na cor da pele do suspeito.

O homem negro, preso com 1,5 g de cocaína, foi condenado a quase oito anos de prisão e alegou ter sido vítima de busca pessoal por perfilamento racial. No inquérito, os agentes de segurança afirmam ter avistado "ao longe um indivíduo de cor negra, que estava em cena típica de tráfico de drogas, uma vez que ele estava em pé junto ao meio-fio da via pública e um veículo estava parado junto a ele como se estivesse vendendo algo".

Os ministros entenderam que não ficou caracterizado que a busca ocorreu motivada pela cor da pele do réu e mantiveram as provas.

Em seu voto, o presidente do STF, Luís Roberto Barro, afirmou que há um racismo  estrutural no país que exige a tomada de posições em relação ao tema. Também disse que, se fosse prender todos os portadores de 1,5 gramas de cocaína e condená-los a dois anos e 11 meses na zona sul do Rio de Janeiro, mesma cidade do episódio do caso concreto, "o sistema carcerário ficaria mais lotado ainda do que já está".

"A prisão por 1,5 grama de cocaína é muito reveladora de um perfilhamento que, se não for racial, pelo menos é social. Revela o tratamento desequiparado em partes diferentes da cidade. É possível que em alguns lugares de Ipanema e de Leblon sejam mais suspeitos do que o bairro de Santa Teresa para este fim", afirmou.

Ele também afirmou que a política de drogas consistente em prender pessoas pobres de periferia com poucas quantidades de droga "não serve para absolutamente nada, salvo engrossar a legião do crime organizado que se instalou nos presídios brasileiros".

"Não há nenhum proveito em prender um jovem primário e de bons antecedentes por 1,5 grama de maconha. Não faz bem a ninguém essa política pública", afirmou.

Já o ministro Gilmar Mendes lembrou que há discrepâncias no tratamento de ações policiais na zona sul e nas comunidades, que têm realidades muito complexas. Ele afirmou que há situações de perfilamento racial e também problemas no contexto do desenvolvimento social.

"Talvez a nossa contribuição mais efetiva seja conseguir formular balizas, normas de organização, e procedimentos que ajudem na mitigação desses fenômenos", afirmou.

Álvaro Palma de Jorge, professor de direito constitucional na FGV (Fundação Getúlio Vargas), diz ser a decisão da Supremo uma garantia dos direitos constitucionais. "O julgamento de hoje reforça uma série de decisões do STF contra preconceitos. Ela passa uma mensagem de que o Estado não deve tolerar qualquer prejulgamento", avalia.

Porém, o professor diz ter dúvidas quanto à real capacidade de a nova jurisdição mudar a conduta de policiais.

"Toda vez que você impõe restrições com consequências, isso gera novas avaliações sobre como fazer as coisas. Acontece que é fácil burlar algo tão subjetivo. Os agentes podem aprender meios de burlar. Isso deve ser observado", diz.

Já Marina Dias, diretora-executiva do IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa), é mais categórica. Para ela, a decisão do Supremo "muda muito pouco".

Fonte:Folha de São Paulo
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