13
Mai/14 |
Jota Alves: Onerosidade na rede pública de educação |
Há algum tempo venho acompanhando a polêmica em torno das cobranças de taxas e aquisição de materiais pagos imposta aos alunos da rede pública de ensino. Em universidades, colégios, escolas e até mesmo em creches é possível notar este tipo de prática. São os profissionais da educação tentando suprir a ausência do Estado com recursos dos próprios alunos.
Notadamente se percebem diversas falhas no sistema educacional brasileiro.
Problemas como a falta de materiais básicos, até mesmo cadeiras e mesas, salas de aulas em péssimo estado de conservação, falta de qualificação da mão de obra empregada, baixa remuneração dos profissionais, e até mesmo o avanço de série por alunos que ainda não estão capacitados, entre outros fatores, colocam o Brasil em uma situação desconfortável se comparado a outros países.
Recentemente foi divulgado um estudo onde os brasileiros ficaram em 38° lugar entre estudantes de 44 países em um exame de solução de problemas matemáticos feito pela Organização para a Cooperação de Desenvolvimento Econômico – OCDE. Enquanto os jovens de outros países que participaram da avaliação tiveram média de 500 pontos, os brasileiros atingiram em média apenas 428. O estudo mostra ainda que 47,3% dos nossos estudantes tiveram baixo desempenho e apenas 1,8% conseguiram solucionar questões mais complexas de matemática.
Outro estudo aponta que quase 40% dos universitários do país têm alguma dificuldade com leitura, escrita e interpretação de textos. Este ainda aponta que 38% dos que têm ou estão cursando um curso de graduação não possuem alfabetização plena, isto é, têm dificuldades para lidar com textos e cálculos mais longos. De acordo com especialistas, o ideal seria ter alunos com 100% de alfabetização plena a partir do ensino médio.
Toda essa defasagem, somada com a ausência de uma política eficaz, e a falta de investimento estatal, faz com que professores, diretores e os demais profissionais da educação, preocupados realmente com toda esta situação, tomem medidas “desesperadas”, visando melhorar a qualidade do ensino. Para isso, desenvolvem projetos pagos dentro de instituições públicas. Associações de pais e mestres, eventos comemorativos e para diversão, materiais didáticos e de higiene, e até mesmo a reforma, manutenção e benfeitorias nas instituições acabam sendo pagas de forma direta pelos profissionais, pais e alunos. Esta conta o Estado não assume, restando a sociedade pagar “duas vezes” para ter o mínimo de qualidade nas escolas, colégios e universidades públicas. Isto não seria um problema se tivéssemos uma sociedade equilibrada e não tivéssemos uma distribuição de renda tão desigual.
Durante uma edição do programa Mundial Notícias, na Rádio Mundial FM, fiquei comovido com o relato de uma avó, afirmando que nas primeiras quartas-feiras de cada mês já não permitia mais que seus netos fossem à escola, pois nestes dias aconteciam eventos para a diversão da criançada. Brinquedos, alimentação diferenciada, tudo instalado pra fazer a diversão da garotada, até aí tudo bem, mas, para brincar e comer, o aluno era obrigado a pagar, e pela falta de dinheiro ela estava se vendo forçada a manter seus netos em casa para não envergonhá-los.
A boa intenção dos profissionais da educação deve ser reconhecida, mas infelizmente, o que pode ser visto como uma melhora na qualidade de ensino e vida destes alunos pode também ser compreendida como ferramenta de discriminação e isolamento, podendo gerar graves consequências para os discentes. Não participar, por falta de dinheiro, de um evento que acontece dentro de um ambiente que é considerado como a sua “segunda casa”, pode fazer o aluno se sentir envergonhada, humilhado e discriminado por sua condição.
Uma alternativa seria criar uma espécie de fundo para custear as despesas relativas aos alunos pertencentes a famílias que não possuem renda no período, colocando a disposição destes a possibilidade de apresentarem uma declaração de insuficiência de recursos, como acontece na realização de concursos públicos, e assim, inseri-los de forma indiscriminada nas atividades ou eventos pagos que a instituição promover, bem como, desobrigá-los de pagar por materiais de uso ou aquisição obrigatória.
A atenção devida a situações assim é fundamental para a real melhoria do ensino. A educação pode ser considerada a melhor ferramenta para promoção social, portanto, mesmo com o Estado ausente, deve ser obrigação de todos melhorá-la.
No entanto, qualquer ação deve ser criteriosamente estudada, pois geralmente quem procura uma instituição pública é porque detém de pouco ou nenhum recurso para bancar os estudos, qualquer cobrança em dinheiro poderá por em situação vexatória, pais, responsáveis e alunos com baixa renda.
Jota Alves
Radialista – Apresentador do Programa Mundial Notícias na Rádio Mundial FM e Colunista do Blog do Sigi Vilares.