
Maria Angela e Bernardo Tochilovsky
Uma das cores que dá vida ao mês de abril é o azul, tom que reforça as campanhas promovidas para ampliar o entendimento, combater preconceitos e incentivar políticas de inclusão para pessoas no Transtorno do Espectro Autista (TEA), popularmente conhecido como autismo.
No dia 2 de abril, é celebrado o Dia Mundial da Conscientização do Autismo, instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU). A mobilização busca destacar a necessidade de adaptações para que pessoas autistas tenham acessibilidade, oportunidades de desenvolvimento e respeito em todos os espaços sociais.
Mas o que é o TEA?
De acordo com o Ministério da saúde, o TEA é caracterizado pela alteração das funções do neurodesenvolvimento, impactando a comunicação verbal e não verbal, a interação social e o comportamento. Pessoas autistas podem apresentar padrões repetitivos de ação, hiperfoco em determinados objetos ou temas e dificuldades em compreender nuances da linguagem. Os níveis de suporte do autismo variam desde o 1 ao 3, sendo que último nível precisa de mais suporte integral ao longo da vida.

Bernardo Tochilovsky
Importância do suporte familiar e da luta pela inclusão
O suporte familiar é essencial para o desenvolvimento e bem-estar da pessoa autista. As mães, muitas vezes as principais cuidadoras, enfrentam desafios diários para garantir terapias, inclusão e qualidade de vida para seus filhos. Entre lutas e conquistas, elas se tornam referência na busca por direitos e oportunidades, desempenhando um papel indispensável na construção de uma sociedade mais acolhedora.
É o que revela Marleide Nogueira, mãe atípica do tetracampeão mundial de parajiujitsu Igor Nogueira, de 29 anos, conselheira titular no Conselho Estadual da Pessoa com Deficiência e militante da causa. Ela enfrentou anos de incerteza até obter o diagnóstico do filho, lidando com a falta de informação e de suporte especializado. “Quando recebi o diagnóstico, foi algo que me marcou profundamente. O neuropediatra me disse que meu filho não leria, não escreveria e não teria capacidade de amarrar o próprio cadarço”, conta.
Marleide ressalta que o esporte transformou positivamente a vida do seu filho e de toda a família e ressaltou que com oportunidades pessoas autistas podem se desenvolver e mostrar todo o seu potencial para o mundo. Hoje, ela destaca a evolução das políticas públicas, mas reforça que ainda há lacunas a serem preenchidas.
“Pouco se fala dos autistas na fase adulta. Muitos com diagnóstico tardio acabam sentenciados em casa, sem suporte adequado. E não podemos nos esquecer das mães, que muitas vezes são abandonadas por seus parceiros e enfrentam essa luta sozinhas”, explica.


Igor Nogueira Marleide Nogueira e Igor Nogueira
Desafios e conscientização
Um dos maiores desafios enfrentados por pessoas autistas e suas famílias é o preconceito. Marleide enfatiza que cada autista é único e que não há um “modelo” de comportamento. “Muitos dizem que autistas vivem no próprio mundo, mas isso é capacitismo. São pessoas com uma forma diferente de processar informações e de se relacionar”, ressalta. Ela reforça a importância da luta coletiva e do fortalecimento das redes de apoio.
Autismo e Mercado de trabalho
Neste Dia Mundial do Autismo, a importância da inclusão no mercado de trabalho ganha ainda mais destaque. Para Daniele Santana, autista e especialista em Recursos Humanos e Carreira, há avanços notáveis, mas ainda existem desafios a serem superados.
“Temos visto progressos nos últimos anos, com mais empresas reconhecendo a importância da diversidade e criando programas de inclusão. No entanto, ainda há muito a melhorar. Muitas vezes, as iniciativas são pontuais ou focadas apenas em recrutamento, sem uma estrutura de suporte contínuo”, destaca.
Ela ressalta que a inclusão real passa por adaptações no ambiente, como ajustes na iluminação e no controle de ruídos, comunicação clara e treinamentos específicos para líderes e equipes. Além disso, Daniele reforça que a falta de preparo das empresas ainda é um grande obstáculo para profissionais autistas.
“Muitas empresas demonstram boa vontade, mas falta conhecimento prático sobre como criar ambientes verdadeiramente inclusivos”, explica. Entre as medidas essenciais, ela aponta treinamentos sobre neurodiversidade, flexibilização de horários e formatos de trabalho, além de processos seletivos mais acessíveis, que não excluam candidatos autistas por conta de dinâmicas sociais pouco adaptadas.
A especialista enfatiza que ouvir os próprios colaboradores neurodivergentes é fundamental para construir políticas eficazes e garantir que a inclusão vá além do discurso.
A arte como linguagem: a história de Bernardo Tochilovsky
Para Bernardo Tochilovsky, jovem artista com TEA, a pintura se tornou um meio essencial de expressão. Desde pequeno, ele desenhava as pessoas de quem sentia saudade, encontrando nas cores e nas formas uma maneira de organizar sentimentos e pensamentos.
“Quando eu era pequeno, eu desenhava as pessoas que iam embora. Eu ia ficar triste e sentir saudade, então pintava para me sentir alegre. Quando eu pinto, eu me sinto quietinho. Gosto de pensar e gosto de pensar nas pessoas que amo”, relata.
A arte não apenas lhe proporcionou um canal de comunicação, mas também abriu espaço para que sua voz fosse ouvida. Bernardo defende mais oportunidades para artistas neurodivergentes e acredita que sua obra pode despertar alegria no público. “Eu gosto que as pessoas vejam meus quadros, porque acho que isso vai provocar felicidade nelas, e eu gosto de ver as pessoas felizes”, afirma.
Para Maria Angela Tochilovsky, mãe do artista Bernardo, acompanhar seu desenvolvimento foi um desafio repleto de aprendizados. Ela percebeu, ainda na infância do filho, que ele expressava emoções através do desenho. Mais tarde, a escola incentivou a pintura como uma forma de canalizar seus sentimentos.
“A arte é uma via de expressão maravilhosa, especialmente para pessoas com extrema sensibilidade e percepção aguçadíssima”, destaca. No entanto, ela alerta para a importância de valorizar o talento pelo que ele representa artisticamente, sem reduzi-lo a um viés capacitista.
Maria Angela aconselha outras mães a confiarem em seus filhos e acompanhá-los em suas descobertas. “Busquem tratamento, mas principalmente escutem o que eles têm a dizer. Encontrem junto com eles uma linguagem comum”, finaliza.
O caminho da inclusão exige persistência, informação e mobilização social. Em abril e ao longo de todo o ano, é essencial ampliar a conscientização sobre o autismo, garantindo que mais pessoas tenham acesso a diagnóstico, suporte e oportunidades de uma vida digna e plena.